Em uma das sessões mais emblemáticas de sua história recente, o Conselho Universitário (CUn) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) aprovou nesta sexta-feira (6) importantes deliberações relacionadas ao relatório final da Comissão Memória e Verdade (CMV), marcando um passo firme no reconhecimento de violações ocorridas durante a ditadura civil-militar (1964-1985) e no compromisso da instituição com a reparação histórica.
A reunião foi realizada no Auditório da Reitoria com ampla participação da comunidade acadêmica e transmissão ao vivo pelo YouTube. O primeiro item debatido foi o pedido de impugnação ao relatório final da CMV, protocolado pela família do ex-reitor João David Ferreira Lima. A petição apontava supostas lesões à honra e ao contraditório, alegando que o relatório da CMV extrapolou seus limites legais ao envolver episódios fora do escopo da Lei nº 12.528/2011.
O parecer do conselheiro-relator Ubirajara Franco Moreno, aprovado por unanimidade, reconheceu o direito da petição, mas defendeu a legitimidade do relatório enquanto instrumento histórico e memorialístico, sem efeitos jurídicos diretos. O Conselho acolheu parcialmente o pedido: limitou o escopo da CMV ao período legalmente definido e determinou a inclusão da obra de defesa da família na Biblioteca Universitária e no Instituto Memória e Direitos Humanos. Também recomendou que futuras decisões sobre a retirada de homenagens ocorram por meio de processo administrativo com ampla defesa.
Na sequência, o Conselho analisou o andamento das 12 recomendações da CMV. O parecer conjunto dos conselheiros Alex Degan e Amanda Zamboni recebeu aprovação por maioria, com apenas dois votos contrários. O parecer validou diversas ações propostas, como a criação de programas sobre direitos humanos, ampliação dos acervos históricos da UFSC e recuperação do prédio do Centro de Convivência, sede do DCE. A proposta mais polêmica — a Recomendação 6, que trata da possível retirada do nome de João David Ferreira Lima do campus da Trindade — deve ser deliberada em sessão especial, com votação aberta e quórum qualificado de 3/5.
Durante os debates, conselheiros destacaram o papel educativo da universidade na preservação da memória coletiva, citando pensadores como Theodor Adorno e Walter Benjamin. A conselheira estudantil Sofia Garcia Bastos emocionou ao vincular o debate às lutas contemporâneas da comunidade acadêmica por dignidade e justiça social. Já o conselheiro Lucas Eduardo Brum reforçou que o objetivo não é julgar moralmente o ex-reitor, mas reconhecer a responsabilidade institucional da UFSC durante o período autoritário.
Os documentos analisados pela CMV incluem inquéritos e correspondências assinadas pela antiga reitoria, evidenciando colaboração ativa com órgãos de repressão. O relatório da CMV, aprovado em 2018, foi resultado de quatro anos de trabalho, análise de mais de 1.500 documentos e oitivas de testemunhas.
Com as decisões desta sexta-feira, a UFSC reafirma seu compromisso com a verdade, a memória e os direitos humanos, em um processo que, segundo o professor Paulo Pinheiro Machado, “não apaga a história, mas a ilumina”. A próxima etapa será a deliberação específica sobre a possível mudança do nome do campus, em data a ser definida pelo Conselho Universitário.



Compartilhe essa informação com quem precisa saber!
Entre na comunidade do AGORA FLORIPA e receba informações gratuitas no seu Whatsapp!