Um valioso acervo com documentos inéditos sobre a repressão militar em Santa Catarina está agora disponível para consulta pública na UFSC, em Florianópolis. Trata-se da coleção reunida ao longo de mais de 25 anos por Derlei Catarina de Luca, catarinense que foi perseguida, presa e exilada durante o regime militar. O material preserva a história de dezenas de vítimas da ditadura e pode ser acessado mediante cadastro no site do Acervo Memória e Direitos Humanos da universidade.
Entre os arquivos digitalizados estão boletins do Serviço de Polícia do Exército, manuais de interrogatório, fotografias originais, reportagens, cartas pessoais, listas com nomes de desaparecidos e documentos raros sobre vigilância na UFSC e em outras instituições. Também estão registrados casos emblemáticos, como o do deputado Paulo Stuart Wright, do advogado Arno Preis, do marinheiro Divo Fernandes D’Oliveira e do jornalista Rui Osvaldo Aguiar Pfutzenreuter.
A coleção faz parte do acervo do Comitê Catarinense Pró-Memória dos Mortos e Desaparecidos Políticos (CCPMMDP), primeiro grupo do Brasil criado para preservar a memória das vítimas do regime militar. O material foi doado ao Memorial dos Direitos Humanos da UFSC e hoje é mantido pelo Instituto Memória e Direitos Humanos (IMDH), com parte também sob custódia da UDESC.
Ao todo, são mais de mil itens organizados em aproximadamente 12 caixas. A digitalização começou em 2022 com o trabalho de uma equipe multidisciplinar da universidade, composta por historiadores, museólogos e especialistas em ciência da informação. Cada item é escaneado cuidadosamente, mantendo a ordem e o conteúdo original, mesmo quando o material apresenta siglas e codinomes usados por órgãos da repressão.
O acervo é uma ferramenta importante para pesquisadores, estudantes e autores de trabalhos acadêmicos. Ele oferece acesso direto a documentos que muitas vezes não existem em nenhum outro lugar, servindo como base para investigações históricas, teses, documentários e publicações.
A história de Derlei de Luca ajuda a entender o valor dessa iniciativa. Ela foi presa em 1968 durante o 30º Congresso da UNE, em Ibiúna (SP), quando centenas de estudantes foram detidos pelo Exército. Após ser fichada e solta sob liberdade vigiada, Derlei foi exilada e viveu em diversos países da América Latina antes de retornar ao Brasil. Desde então, dedicou sua vida à coleta e preservação de documentos que ajudassem a resgatar a memória das vítimas da ditadura.
O acervo da UFSC revela detalhes antes pouco acessíveis sobre pessoas como Paulo Stuart Wright, deputado cassado em 1964 e morto sob tortura em 1973; Arno Preis, enterrado sob nome falso e executado após tentativa de fuga; Divo D’Oliveira, líder comunista desaparecido e só reconhecido décadas depois como vítima política; e Rui Pfutzenreuter, jornalista assassinado com sinais de esquartejamento pelo DOPS.
Essas histórias, entre tantas outras registradas, ajudam a reconstruir o passado sob uma nova perspectiva: a de quem viveu na pele os impactos de um regime autoritário. A iniciativa da UFSC amplia o acesso à verdade, permite novas investigações e dá voz a trajetórias antes silenciadas.
O acervo está disponível para consulta digital no site do Acervo Memória e Direitos Humanos da UFSC e representa uma oportunidade única para compreender como a ditadura impactou vidas em Santa Catarina — e como a luta por justiça continua ecoando até hoje.








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